setembro 20, 2010

a criada com pantufas cor de rosa


Junto ao portão verde move-se uma senhora cujos olhos de mágoa aspiram a revolta contra a filha que teima em fugir da sua vigia.
A criança agitada grita com a criada que cheira ao pó dos móveis da casa onde trabalha.
Para lá do portão, avista-se um pequeno terreno de ervas perdidas que transpiram o sabor da infelicidade. Será que ela terá consciência do acto criminoso? Não. Ela não sonha em plantar árvores de fruto nem deixar a criança ser feliz na sua liberdade. Revoltada com o tempo, ela sonha com vestidos de gala pendurados num camarim de uma artista que está morta.
Essa artista com lábios pintados de vermelho vivo que nunca beijaram ninguém, nem se aproximaram do corpo de um homem.
A criança sim. Essa sonha com um pomar onde ela possa correr e fugir dos inimigos da mãe dela. Sonha com o rosa das flores que finge tocar no vazio do terreno multado pelo portão. Grita pela liberdade enquanto a mãe riposta delirando com diamantes cor-de-rosa.
Mas o que ela não sabe é que o único cor-de-rosa que existe é o das pantufas que ela calça.

Sem comentários:

Enviar um comentário