abril 30, 2013

10h06

A noite não é leiga, e caio sempre na tentação de me refugiar nela. Por conseguinte, talvez por fraqueza do coração, nunca te adivinhei as surpresas António.
Nunca consegui calcular com precisão esse momento onde olharias à tua volta, não visses ninguém, a janela do teu quarto, o teu altar e o vento a passar-te nos pensamentos até perceberes que a solução está em mim.
Não me quero regozijar com esse facto, mas deixa-me um sabor especial na boca quando o teu corpo cede, quando ele se vinga nas tentações animais de me procurar sempre na noite e de registar mais um sorriso na minha presença. E, admito sim, que essa tua candura me enlouquece. Que essa digestão bem feita dos dias me contagia e me tiras as náuseas provocadas pelas tuas ausências inesperadas.
É mais outro tempo que te ajuda a conquistar a luz e a conclusão de que eu seria a única pessoa por quem voltarias atrás. Porque é a mim a quem falas dos outros banais, e essa é tua excepção. Sou a excepção que veste o teu casaco no frio da noite e te testa o hálito. Sou a bebedeira que te põe a mexer desenfreadamente no jardim de t-shirt e barba arranjada. Sou a excepção que te deixa ser homem antes de regressar ao dia enfadonho. Olha como és fraco na luz e precisas tanto do escuro! O refúgio onde desenvolvo os pensamentos e me dedico às questões fenomenais.
Penso sempre que mais ninguém deixa de dormir nesse intervalo onde as corujas falam e o relógio sua da velocidade estonteante.
E tu és as horas que não passam, que se demoram e entrecruzam no negrume.
E não, não escondo o desejo pelo púlpito dos teus olhos. Olhar castanho florestal. A tensão nos teus lábios molhados que provariam os meus se eu to pedisse. A fractura da coragem do meu semblante na nossa proximidade, nos teus abraços virolentos.
Na tua estrutura beata relatas a imensidão de ternura e excitação que tens por mim, e na noite as horas passam mais devagar.
A sapiência dos dias é que te enjoa e enlouquece, e a próxima vez que escrever sobre ti, será a fim de o dizer mais uma vez. Que quando a tua existência deixar de pesar e for vazio, também ela vai deixar de estar. A magia da contradição do nosso estado de amor.
Somos azul, ainda te lembras?

1 comentário:

  1. não sei se queres contá-lo ou queres que o adivinhe, só sei que azul é cor de céu e cor de mar, cor de infinitos. nem que seja a memória eterna

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