fevereiro 16, 2015

Primavera

Esta foi uma das deambulações onde planeámos a nossa viagem aos lugares da Europa. 
O choque tinha acontecido no gabinete da Universidade, onde por meros segundos me agarrei ao armário de metal não querendo acreditar na verdade que acabara de descobrir. 
Envolvia um quadro, uma origem. Vejam como tudo pode acontecer sem esperarmos.
Nesse momento já eu precisava de uma bebida, e ordenei um Porto. Ele bebeu uma espécie de álcool totalmente diferente dos Cosmos que as mulheres americanas adoram quando saem com as amigas.
Na conversa envolvida pela atmosfera do bar do restaurante, desenvolvemos duas conclusões.
Nunca mais falaríamos do assunto, ou viajaríamos até à sua criação.
A segunda soava mais tentadora para mim, atrevo-me a dizer aos dois.
Não lhe confessei que quando se virou para mim no escritório permitindo uma curta distância entre nós, eu hesitei. A proximidade intimidava-me incitando-me ao contrário. Eu não queria sair dali. Poderíamos ficar horas a discutir o assunto dentro do constrangimento de paredes rodeadas de almas curiosas. O mundo académico é traiçoeira, por isso dirigimo-nos ao bar.
Acho que a decisão foi unânime. Sorrimos um para o outro, tal como sorrimos com sedução no jardim Húngaro uns meses mais tarde.
Entre esse procedimento emocional, ainda assistiria eu à defesa da sua tese de Doutoramento, depois falaríamos longe dos olhares até ao dia em que embarcássemos no avião. Aí eu estava nervosa.
Ninguém sabia o que para ali estávamos a ir. Fomos em segredo. Um segredo considerável.
A última coisa que me lembro envolve esse parque primaveril onde todos os outros falavam uma língua diferente da nossa, até a gestual.
Tínhamos falado com curadores de museus, e até jantado algumas vezes sob presenças importantes do mundo académico. Essas eram as obrigações que todas as pesquisas envolvem.
Por fim estávamos ali cobertos de sopro leve de vento. O sol não se agitava. Permanecia sempre no mesmo sitio passando entre as faixas do meu cabelo curto que tapavam metade do meu rosto, metade do meu sorriso.
Ele sorriu também concordando em silêncio que poderíamos fazer amor. Aquela seria a primeira vez, a mais violenta.
O seu corpo era tão desconhecido até esse dia. Até essa noite apenas conhecia as formas tapadas de camisas e fatos formais destinados a causar a impressão que desejávamos nos sítios por onde passámos.
Depois de nos termos dentro um do outro, tudo passou a ter um significado diferente, já não quis outro cheiro.
Já não sabia em que mundo pertencia.



2 comentários:

  1. Incrível.
    É possível sentir o encanto e a vontade pelas palavras e pela narrativa.

    Um bom final de semana.

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    1. concorri com este texto a um concurso de escrita romântica. Terá hipóteses? Obrigada pelo comentário!:)

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