Sabes que hoje me apercebi que realmente há coisas que não precisam de ser pensadas? Acho que realmente gosto de Alberto Caeiro, e a sua simplicidade não me faz confusão nenhuma. Gosto do poema em que se auto-entitula um não-guardador de rebanhos. Quando ouvi a professora Patrícia lê-lo fiquei com arrepios na pele e com um quente suave enquanto me imaginva estentida por um prado qualquer, algures num sítio bem longe daqui.
Gosto da ideia de apenas ver , e sentir as coisas naturalmente. É assim que a nossa relação funciona, naturalmente.
Ontem quando cheguei a casa, depois de almoçar,fui para onde gosto mais de ir no mundo inteiro. Para o papel. Depois de comprar no chinês umas meias pretas de licra, 4 bases de silicone para as sapatilhas de ballet, comprei um pequeno caderno que apesar de novo me trouxe recordações velhas. Olho para ele e sinto-o velho.
As veias aceleraram no meu corpo e mal cheguei a casa peguei nas minhas coisas e fui escrever. Já é o terceiro caderno novo que compro no chinês e não me canso de os gastar. São cadernos simples, nada caros, que custam apenas cêntimos. Não são precisas grandes coisas para sermos felizes. E hoje enquanto pensava nas coisas que teria que levar para Praga no sábado, apercebi-me que a primeira coisa que terá lugar no fundo da minha mala será o pequeno caderno beje, a minha caneta, o livro da stephanie e um lápis e uma borracha. Só preciso disso. Depois vêm as coisas habituais como as pastilhas, a roupa, os cachecóis, os gorros e as belas das meias para aquecer os pés. Tive em consideração que iríamos sair à noite daí a primeira vez que comprei umas meias de licra preta finas para estrear.
Não gosto de comprar coisas apenas para uma ocasião. Talvez as meias serão abandonadas na gaveta num futuro próximo, talvez as darei à minha filha, talvez irão para o lixo mais cedo do que penso. Não quero pensar nisso. Pensar é estar doente dos olhos, como diz o Caeiro.
E foi nesse pequeno caderno que dediquei a carta mais longa à pessoa que ainda não existe. Espero que quando a leres percebas que estou a falar de ti pequenina. E espero que a tua mãe mais tarde perceba a intenção daquela carta. Espero que a tua mãe Joana e o teu pai Bruno percebam que a nossa amizade foi tão grande que durou o tempo suficiente para não me esqueçer daquele pequeno caderno que te irei oferecer no 17º aniversário. Espero que gostes miuda, porque agora que tenho 17, a caminhar para os 18, imagino que não irás gostar de ler, nem ter paciência para coisas 'antiquadas' que eu e a tua mãe amávamos no tempo de elas existirem.
Espero que a tua mãe te leve ao teatro antes de teres 17,espero que ela te conte as nossas histórias de miudas, e espero que ela te incentive a escrever muito, porque senão, vais ter uma tia chata-bacana que te irá visitar e estar contigo às horas de almoço para tomar-mos um café e falarmos da tua escola e dos teus amigos. Espero passar fins-de-semana contigo e espero relembrar-te que escrever aos amigos é importante. É essencial.
Por favor não faças a cabeça da tua mãe em água porque ela é uma excelente pessoa, mas certas coisas não lhe cabem na cabeça.
E não te esqueças de lhe pedir de vez em quando um abraço e de lhe dizeres que a amas. Eu queria fazer isso mas ainda não posso. Quando ela me vier buscar à escola no carro dela (um dia destes) e me apresentar o teu pai, logo lhe ofereço um desses abraços e digo-lhe que a amo. Até lá miuda espero que te apercebas que tudo isto tem um sentido. Espero quando cresceres, teres a oportunidade de leres um post dum blog e que me perguntes mais tarde como foi a nossa adolescência.
Quando quiseres podes sempre me ligar ou mandar uma mensagem que eu estarei aí para te afagar as lágrimas ou para passarmos uns tempinhos juntas. Primeiro terás de pedir à tua mãe, mas ela irá deixar de certeza. Ela é uma pessoa compreensiva. Tem muito amor para te dar. Não te admires quando nasceres e eu te for ver à maternidade, e chorar que nem uma criança e te querer pegar ao colo a toda a hora. Tens de compreender estas coisas. Afinal de contas és a filha da minha melhor amiga. És o meu pequeno orgulho que há tanto espero conhecer.
Um dia, daqui a alguns anos lembra-te de me pedires uma fotografia da tua mãe no casamento dela, para as duas rir-mos e dizer-mos 'Que linda!' estava ela naquele vestido de noiva. Apesar de sempre pensar que a tua mãe nunca iria casar, desta vez tenho a certeza, e acho bem que assim o seja.
O teu pai quando te vir vai ficar radiante. Ele é muito querido, vais gostar dele de certeza.
Ah uma coisa muuuito importante miuda. Não te vais safar de ser do Sporting nem de ires com todos nós ao estádio de Alvalade ver muitos jogos para mandarmos bocas e ver petardos no ar, enquanto os ouvidos doem. Por favor, não me sejas do Porto. O Sporting já é nosso desde a adolescência. Uma vez eu e a tua mãe ficámos horas a conversar ao telefone quando ela foi ver o Sporting com o Porto (se não me engano) e acredita que nunca mais me vou esqueçer. Ela depois conta-te.
Não te quero maçar mais os miolos mas quero muito contar-te isto que ando a sentir, porque quando receberes aquele caderno e leres este post, eu já vou ter uns 30 e tal anos, talvez quarenta e a tua mãe também. Já não vou ter 17 anos como agora, e é importante teres alguém que partilhe as tuas experiências e que perceba o que estás a sentir.
Quando quiseres ir estudar para Londres ou para outra cidade europeia qualquer, já sabes que podes falar comigo primeiro se tiveres medo de falar com a tua mãe Joana. Eu percebo-te e ajudo-te a convencê-la se tal for necessário. Mas nada de abusares da sorte sua malandra. Já não vou ser adolescente portanto já estás avisada.
Para te sentires mais à vontade nestes assuntos não te esqueças de ver o Diário de Briget Jones e de leres 'A Rapariga das laranjas' e 'A Lua de Joana'. Vais adorar o 'Fazes-me Falta' e outros livros que a tua mãe se irá encarregar de te aconselhar. Ela adora os livros da Margarida, tal como eu. Não te esqueças de ir a um video clube e pedir pelo 'Avatar' 'Armmageddon' e pelo 'Pearl Harbour'. Por favor, quando a tua mãe te comprar um mp4 ou ipod ou que houver de novo nessa altura ( de certeza que a tecnologia estará bastante avançada), pede-lhe algumas músicas do tempo dela para ouvires quando andares de comboio ou de autocarro. Ouve música, sim? É tão bom. Vai ao teatro e vai à discoteca abanar o capacete, pelo menos uma vez na tua adolescência. Se apanhares uma bebedeira já sabes que estarei aqui para te amparar, ou se algum desgraçado acabar com o vosso namoro eu irei atrás dele. Tal como te estou a prometer agora.
Sei que vais estar linda miuda. Quando tiveres 17 vais ter os olhos fortes da tua mãe. Espero que herdes tudo de bom e mau dela. Espero que sejas tão diferente dela mas tão igual. Trata de lhe dar uns beijinhos de vez em quando e de tirares uma tarde para ires às compras com ela. E pede ao teu pai para ires fazer a tua tatuagem com ele. É mais seguro. O teu avô fez isso com a tua mãe.
Sê feliz e não te esqueças de dizer à tua mãe, que eu estarei à espera dela no Rossio para irmos tomar café antes de eu ir trabalhar.
Um beijinho grande,
Com amor,
Tia Mariana.
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